19 de dezembro de 2009

Doidas e Tarados no Facetuga

Com mais de 900mil utilizadores, a "nossa" rede social dá sinais de enlouquecer

A palavra do ano de 2009 segundo o "New Oxford Dictionary" foi sacada do Facebook e é unfriend que significa remover um utilizador da categoria de 'amigo'. Tipo 'desamigar' ou 'anulamigar'. É um verbo, uma acção, um enxotar. Mas mesmo assim menos violenta que bloquear - que é um acto de snipper, que visa evaporizar alguém, em vez de apenas o retirar da vista. Desamigar é um fazer 'desaparecer' da minha propriedade, mas não um é passeio de helicóptero com um ditador sul-americano dos anos 70. Para mais não ser visto.
O que me parece relevante é que a palavra deste ano seja uma reacção negativa no meio de toda a terminologia criada sobre a rede social Facebook. Não é um acto de hossana à amizade 'facebuquiana' mas um corte de relações. É um xóó.
Isto do Face não é apenas uma obsessão minha - até já saí de lá há umas semanas (um dia de cada vez, um dia de cada vez...). Em Janeiro deste ano o número de utilizadores em Portugal era de 150 mil. Hoje ultrapassa os 910 mil, e tem já grande incidência nas gerações mais cotas. Tal equivale a um aumento de 507% este ano. O que deverá ter efeitos na produtividade nacional. A nível mundial atingiu os 300 milhões de utilizadores, metade dos quais entre os 25 e os 44 anos.
E a verdade é que nos últimos meses a vida no FB português parece estar a mudar e a perder a sua inocência - verdade seja dita que a parte nebulosa dos relacionamentos amorosos tenha estado no subtexto por baixo do muro (alguns psiquiatras garantem que 'Facebook' é hoje das palavras mais ouvidas nos seus consultórios). Já diziam em 2008 os e-sarcásticos que o Facebook é o sonho tornado realidade dos stalkers, dos voyeurs, da CIA e do FBI, e não é mais que um concurso de popularidade que consiste em reunir pontos a que chamam 'amigos'. Ora tudo isso se regista também no caso português. Mas com quase um milhão de contas neste pequeno rectângulo a asfixia provinciana começa a revelar-se.

Em nove meses de Facebook arranjei uma imagem parva de face-playboy que criei no início para criar buzz para crónicas. Em Agosto fui 'alvo' de uma escroque profissional quarentona que ataca no Face para chantagear e está 'adormecida' a recolher info à espera do momento ideal. Fui convidado pela Sociedade Civil da RTP2 como alegre 'viciado' no Facebook. Uma finalista de jornalismo chegou ao desplante de querer escrever a sua tese final sobre o meu "comportamento no Face".

As histórias bizarras que me foram chegando, de mails nocturnos, guerras por trás do wall, zangas entre 'amigas fecebuquinas', comportamentos bizarros de santinhos, foram-se multiplicando. Uma alegria.
Mas perigosa. As mulheres (e homens...) perceberam que estão mesmo efectivamente vulneráveis a todo o tipo de tarados com que se cruzaram ao longo da vida e que, obviamente, percebem que este é o meio caído do céu para se 'vingarem', para aterrorizar e regressarem através de perfis falsos e de forma sistemática como só mentes doentes conseguem fazer.

Unfriend, 'desamigação' é assim um termo aplicável. Cada vez mais se vai constatando que os colectores orgulhosos de milhares de 'amigos' vão sendo substituídos por perfis fechados, em cocooning, em casulo, com apenas algumas dezenas pessoas. E depois há as notícias de patrões que despedem e seguradoras que descobrem via face. A realidade é lixada.

E quem hoje já tem uns meses desta rede social já consegue perceber o que quer dizer facechulo, facementiroso, facepêga, facejunkie, facecrise de meia-idade, facefilósofo, face-espião, facesnob, facemarmelanço, face-encornanço, facegaranhão, face-rainha, face-youtuber, facegenocídio, facebeicinho, face-suicídio, faceautista, facebipolar e podia continuar... Quem começa a desamigar vai por tipologias.

Estou com facenáusea. Se visse mais algum noviço a descobrir eufórico o vídeo do "Into My Arms" do Nick Cave, ou perder uma ovelhinha do Farmville deixaria de perceber porque é que algum dia voltarei a defender aguerridamente as redes sociais. Quase de certeza o Facebook. Por ora, continuemos o facedetox. Um dia de cada vez, um dia de cada vez...

A lista de 2009 - Na lista da Palavra do Ano constavam termos que significam "escrever sms enquanto se conduz" (Intexicated) ou ou um "banco falido que continua a funcionar com subsídios do governo" (Zombie Bank), uma tatoo nas costas de uma mulher (Tramp Stamp) ou "celebridade morta" (Deleb).

in Expresso, Luís Pedro Nunes

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