À minha volta vejo vidas adiadas e carreiras desmoronadas. Depois leio o que por aí se escreve sobre um povo que não sabe viver com o sacrifício e pergunto-me: em que país vivem os nossos colunistas?
Em frente a mim, um amigo com uma longa carreira almoça. Percebo que não o faz há dias. Demasiado novo para se reformar, demasiado velho para começar de novo, vive no limiar da sobrevivência. Mantém-se bem vestido para tratar das aparências. Tenta manter aquela dignidade que sempre me mereceu admiração.
No chat, converso com um amigo emigrado. Excelente no que faz, quando chegou a Lisboa parecia que a sua carreira não encontraria grandes entraves. Até que, cansado de viver de recibos verdes mal pagos em ateliers que tratam o talento como coisa irrelevante, decidiu partir. Sem nada que o esperasse no destino. Lá se está a safar. Mas, apesar disso, quer saber como isto vai porque ainda não perdeu a esperança de voltar.
Olho em volta e vejo os meus amigos mais promissores a dar aulas em universidades estrangeiras, com condições que aqui seriam virtualmente impossíveis. Outros a trabalhar em call-centers ou a viver de biscates, com as suas vidas adiadas para sempre. Vejo os pais deles a carregarem até à velhice o fardo de garantirem a sua sobrevivência. E a dos netos, quando os filhos tiveram coragem para tanto.
Diariamente cruzo-me com a angústia de vidas impossíveis, onde tudo é contado. De trabalhadores menos qualificados aos melhores quadros que o nosso sistema de ensino produziu. Tanto desperdício de talento que perco a esperança neste país.
Isto é o que vejo. Depois leio textos de colunistas e economistas. Vivemos acima das nossas possibilidades. Habituámos-nos ao bem bom. Perdemos a ética do trabalho. Já não sabemos o que é o sacrifício. Fico agoniado e assalta-me uma dúvida: sou eu que conheço demasiados azarados ou esta gente que escreve nos jornais e fala na televisão vive num País diferente do meu?
Por Daniel Oliveira in Expresso On-Line
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