A grande fome irlandesa de 1845 dizimou a população a tal ponto que
jamais voltou a ser tão grande como então. Como a visão britânica
dominante atribuía a catástrofe à preguiça e à inépcia dos nativos, os
colonizadores rejeitaram os pedidos de ajuda argumentando que era
preciso forçá-los a alterar atitudes culturais inadequadas.
Um século mais tarde, na Índia, os mesmos preconceitos voltaram a ser
invocados pelos ingleses tanto para justificar a fome em Bengala como
para recusar o auxílio massivo às populações afectadas. Neste como
noutros casos, o sentimento de superioridade nacional apaziguou as
consciências e disfarçou a desumanidade das atitudes. "Do que eles
precisam não é de ajuda, mas de reformas."
Curiosamente, nem a
Irlanda, nem a Índia, nem qualquer outro país voltou a padecer de fomes
endémicas a partir do momento em que conquistou a independência e
instalou um sistema democrático, provando que o problema não estava na
carência de recursos, mas na sua distribuição. Definitivamente, a
democracia não tolera a privação massiva.
Diz-se que toda a gente
está interessada no desenvolvimento e que, por conseguinte, ninguém
impõe por gosto políticas de austeridade que condenam as populações ao
empobrecimento. "Ninguém deseja fazer mal às pessoas", eis a sonsa
expressão que diariamente escutamos. Mas apenas os pobres necessitam de
desenvolvimento; os ricos só precisam de criados.
... Sempre que possível, os executivos saídos de eleições são substituídos
por outros liderados por algum economista com o selo de garantia do BCE,
do Goldman Sachs, do Lehman Brothers, ou equivalente. No mínimo, as
pastas da economia e das finanças deverão ser entregues a um legítimo
representante da corporação.
A independência dos bancos centrais
não pode ser absoluta e incondicional, sob pena de dar origem a um
contrapoder inaceitável numa sociedade democrática bem formada. Mas os
banqueiros centrais – uma casta divorciada do sentimento do cidadão
comum – julgam-se hoje no direito de impor aos governos nacionais as
suas políticas preferidas, declarando-as, ainda por cima,
inquestionáveis.
... Quando o sistema financeiro se fecha sobre si próprio e se aliena da
economia real, reclamando sangue, suor e lágrimas sem fim à vista, é
caso para dizer-se que ele se tornou incompatível com a sobrevivência de
uma economia de mercado sofisticada, orientada para a inovação, o
emprego e o crescimento.
Por: João Pinto e Castro, Jornal de Negócios.
Para ler artigo completo: http://www.jornaldenegocios.pt/home.php?template=SHOWNEWS_V2&id=565771
Sem comentários:
Enviar um comentário